Certo dia, discutindo religião com  alguns amigos, fui questionada sobre a origem do meu ateísmo, e eu,  sinceramente, não soube responder de imediato. Então, na tentativa de  escapar daquela falta de resposta, o indaguei sobre a origem da crença  dele, desde quando ele começou a acreditar em Deus? E aí, meus caros, o  jogo virou. E adivinhem? Surprise! Surprise! Ele também não  soube responder. Certo que ele jogou meia dúzias de frases feitas e  religiosas, mas o que eu posso fazer com meia dúzias de palavras  fáceis?! Aquilo não convenceria nem crianças em aula de religião. 
O que fica disso? A certeza de que  crenças e religiões são invenções que nos são imputadas desde o  nascimento, e que se modificam, ao passar dos anos, de acordo com nossa  (in)capacidade de raciocínio. Ninguém nasce acreditando em Deus, mas  existe toda uma educação que contribue para isso. É simples. Você nasce  ateu. A sociedade lhe força uma religião. Daí, ou você resiste, se salva  e vive; ou cai na armadilha da linda palavra divina e vive se privando,  com medo do pecado, vive para morrer e ir ao paraíso.
Imaginem a cena: A criança nasce, é  batizada sem nem ao menos saber o que diabos significa todo aquele  ritual, aí quando começa a querer compreender o mundo e as coisas, ela  questiona:
  
- Mas mamãe, pra quem eu rezo todas as noites? Papai do céu existe?
- Menina, deixa de pergunta idiota. Ajoelha aí e tenha fé.
- Menina, deixa de pergunta idiota. Ajoelha aí e tenha fé.
Que outra opção deram a essa criança a  não ser conformar-se? Manter-se feliz por acreditar em algo que ela  nunca teve a oportunidade de saber quem é.
Em “Deus, um Delírio”, Dawkins  revolta-se contra as classificações que são dadas às crianças, ele  demonstra ser contra a doutrinação de crianças  em qualquer religião.  Para Dawkins, é um abuso dizermos que uma criança é católica, judia ou  mulçumana, por exemplo. Para ele isso é algo tão absurdo como falar de  “criança neoliberal”. Onde está o livre-arbítrio agora? Por que somos  tão egoístas a ponto de não deixarmos as pessoas livres das nossas  crenças e desejos? Que tal deixar a criança crescer, entender e,  sozinha, escolher no que acreditar?
Foi assim, dessa forma absurda e presa,  que cresceram milhares iguais a nós. Crentes e devotos de algo nunca  explicado, nunca visto, nunca comprovado. Algumas dessas pessoas tem a  sorte de serem curiosas, procurar,  elas mesmas, as respostas para todos  os questionamentos não respondidos. A partir daí eu refuto a forma  chula que muitas pessoas classificam os ateus: “ateísmo é derivado  de traumas psicológicos”; “ateus são pessoas que nunca tiveram uma base  familiar forte”; “ateus são pessoas doentes”.
Sim, claro. Como não?! O ateismo é  derivado de um trauma quase que irrecuperável: O trauma de querer  entender o que lhes foi negado. É a fome por aprendizado derivada do  trauma de querer pensar por si mesmo e optar por escolher entre  acreditar em Deus ou não, sem a pressão da família, da escola e da  sociedade geral. São pessoas que, dessa forma, adquiriram resistência à  irracionalidade, e possuem um desconfiômetro que é difícil de ser  reprimido, o tal do Ceticismo.
Todos os ateus que conheço já tiveram  uma religião ou foram forçados a tal, pra eles deve ser mais fácil achar  a origem das suas descrenças. Eles devem saber quando e por quais  motivos deixaram de frequentar a igreja e de ajoelhar-se e esperar uma  resposta do “cara lá de cima” que nunca chegaria.
Quando fui questionada sobre meu  ateísmo, não tive esses períodos de tempos para basear minha descrença, o  que deve ter dificultado a minha resposta. Como alguns devem saber,  nunca fui batizada, e as poucas vezes que frequentei rituais religiosos  foram por motivos escolares ou de morte. Posso dizer que sou uma ateia  natural de fábrica? Talvez. Não fosse a pífia tentativa de querer, algum  dia, acreditar em algo maior que desse sentido à minha vida.
Lembro-me do dia no qual, finalmente,  minha mãe olhou pra mim e descobriu que eu era ateia. Ela descobriu  porque perguntou, não sou de sair me auto-denominando para as pessoas.  Enfim, a cara de decepção era visível a olho nu – “Onde foi que eu  errei?”. Ela quis se sentir culpada por nunca ter me forçado uma  religião, disse que uma pessoa que não acredita em Deus não poderia ser  feliz e nunca teria nada na vida. Eu confesso que fiquei triste na hora e  que, às vezes, já pensei se a vida que levo seria melhor se eu tivesse  no que acreditar. Devaneios, claro! E vi que para ser feliz basta  acreditar em mim, nas pessoas que me são reais e nas coisas que desejo.  Fácil, né? Mas um dia eu consigo. Tenho fé em mim. Meu pai não liga,  aliás, meu pai já não liga há tempos. Acho que ele, mais que eu, nunca  teve fé em nada sobrenatural.
“Quando era criança, minha mulher odiava a escola em que estudava e sonhava poder sair de lá. Tempos depois, quando tinha seus vinte e poucos anos, ela revelou sua infelicidade para os pais, e a mãe ficou horrorizada:
“Mas, querida, por que você não nos contou?”. A resposta de Lalla é minha leitura do dia: “Mas eu não sabia que podia”.
Eu não sabia que podia. Suspeito — quer dizer, tenho certeza — que há muita gente por aí que foi criada dentro de uma ou outra religião e ou está infeliz com ela, ou não acredita nela, ou está preocupada com tudo de mau que tem sido feito em seu nome; pessoas que sentem um vago desejo de abandonar a religião de seus pais e que gostariam de poder fazê-lo, mas simplesmente não percebem que deixar a religião é uma opção.” [Deus, um Delírio]
Quando você diz não ter uma religião  poucas pessoas se importam. Agora, quando você diz não acreditar em um  Deus, o termo ATEU soa como ofensa à vida e a bondade humana. É como se  nós fóssemos aberrações criadas pelo diabo, algum tipo de ataque enviado  a terra para destrui-la. Mas ninguém se dá conta que todo mundo, um  dia, já foi ateu, já não acreditou em nada. E nem todo mundo tem a  coragem de admitir a dúvida e buscar respostas para suas indagações  secretas. Sim, todos temos. Ninguém é estúpido o suficiente para achar  que sabe de tudo e que nada mais precisa ser explicado. Compreender o  mundo transcende aprender a história da biblia. Sua origem é única, suas  (des)crenças também deveriam ser.
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PS:Texto originalmente postado por Juliana no blog ReEvolução.net
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PS:Texto originalmente postado por Juliana no blog ReEvolução.net
 
 
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